2005-09-30

Papel Mata-Borrão - 20.º Pingo de Tinta

Quero dançar ao som de uma nova melodia, reflectir imagens simples e coloridas... - aguardo pacientemente a pausa do Chá do Mestre...

Retalhos de Tira-Teimas - 12

"A minha religião e a minha honra, faço-as consistir unicamente em te amar, já que a amar-te comecei."

Soror Mariana Alcoforado


"Pela boca de Soror Mariana falam todas as puras amantes de Portugal."

Jaime Cortesão

Faúlhas de Cupido

Bastava-nos amar. E não bastava
o mar. E o corpo? O corpo que se enleia?
O vento como um barco: a navegar.
Pelo mar. Por um rio ou uma veia.

Bastava-nos ficar. E não bastava
o mar a querer doer em cada ideia.
Já não bastava olhar. Urgente: amar.
E ficar. E fazermos uma teia.

Respirar. Respirar. Até que o mar
pudesse ser amor em maré cheia.
E bastava. Bastava respirar

a tua pele molhada de sereia.
Bastava, sim, encher o peito de ar.
fazer amor contigo sobre a areia.

Joaquim Pessoa

Pétalas de Bem-Te-Quer - 25.ª

VIDA

- Mâe, o mundo é mau,
Torna a flor lodo
E um pássaro num verme,
E eu não sabia...

- Filha! Semeia flores no lodo,
Empresta o teu canto ao verme.
Se as tuas mãos continuarem puras
E meigo o teu coração,
Acredita que o mundo é belo

E saberás!


Matilde Rosa Araújo

Palavras - XXXIX

De palavra em palavra
a noite sobe
aos ramos mais altos

e canta
o êxtase do dia.

Eugénio de Andrade

Reflexos - LXVIII

O Sol já se escondeu...
Precisamente quando,
feliz,
eu desatei a cantar.
(Só por feliz eu cantei.)

Agora quero acabar,
que já me dói a garganta,
mas
vou ainda cantando,
temendo
dar por mim de novo triste
assim que esteja calado.
(... Como se a minha Alegria
nascesse de eu ter cantado.)


Sebastião da Gama

Verbo do Dia - Amor

POEMA DO AMOR

Este é o poema do amor.

Do amor tal qual se fala, do amor sem mestre.
Do amor.
Do amor.
Do amor.

Este é o poema do amor.

Do amor das fachadas dos prédios e dos recipientes do lixo.
Do amor das galinhas, dos gatos e dos cães, e de toda a espécie de bicho.
Do amor.
Do amor.
Do amor.

Este é o poema do amor.

Do amor das soleiras das portas
e das varandas que estão por cima dos números das portas
com begónias e avencas plantadas em tachos e terrinas.
Do amor das janelas sem cortinas
ou de cortinas sujas e tortas.

Este é o poema do amor.

Do amor das pedras brancas do passeio
com pedrinhas pretas a enfeitá-lo para os olhos se entreterem,
e as ervas teimosas a nascerem de permeio
e os homens de cócoras a raparem-nas e elas por outro lado a crescerem.
Do amor das cadeiras cá fora em redor das mesas
com as chávenas de café em cima e o toldo de riscas encarnadas.
Do amor das lojas abertas, com muitos fregueses e freguesas
a entrarem e a saírem, e as pessoas todas muito malcriadas.

Este é o poema doa mor.

Do amor do sol e do luar,
do frio e do calor,
das árvores e do mar,
da brisa e da tormenta,
da chuva violenta,
da luz e da cor.

Do amor do ar que circula
e varre os caminhos
e faz remoinhos
e bate no rosto e fere e estimula.
Do amor de ser distraído e pisar as pessoas graves,
do amor de amar sem lei nem compromisso,
do amor de olhar de lado como fazem as aves,
do amor de ir, e voltar, e tornar a ir, e ninguém ter nada com isso,
Do amor de tudo quanto é livre, de tudo quanto mexe e esbraceja,
que salta, que voa, que vibra e lateja.
Das fitas ao vento,
dos barcos pintados,
das frutas, dos cromos, das caixas de tintas, dos supermercados.

Este é o poema do amor.

O poema que o poeta propositadamente escreveu
só para falar de amor,
de amor.
de amor.
de amor.
Para que um dia, quando o Cérebro Electónico
contar as palavras que o poeta escreveu,
tantos que,
tantos se,
tantos lhe,
tantos tu,
tantos ela, tantos eu,
conclua que a palavra que o poeta mais vezes escreveu
foi amor,
amor,
amor.

Este é o poema do amor.

António Gedeão.

2005-09-29

Linhas e Entrelinhas - XVIII

Coimbra, 29 de Setembro de 1980

Mais uma campanha eleitoral. Mais um aturdimento retórico e falacioso de ponta a ponta de Portugal. Não há praça sem alto-falante, rua sem bandeira, parede sem cartaz, poste ou troco de árvore sem símbolo partidário.

A televisão e a rádio não dão tréguas aos olhos e aos ouvidos. E os jornais vêm cheios de discursos para todas as paixões. É um derrame de palavras a que nenhum fastio se pode esquivar e em que no fundo ninguém acredita, de tal modo é flagrante a sua inautenticidade.

Mas a projecção do amordaçamento passado e traumatismos ainda recentes juntam-se no retraimento colectivo. E a euforia prosélita, sem cuidar dessas feridas, entende a passividade circundante como simpatia.

Não há facção, por insignificante que seja, que não celebre antecipadamente o triunfo. Reduzidos a um chorrilho de estribilhos, os programas mais antagónicos parecem iguais na obsessão sonora.

O sonho primaveril de um país renascido, lúcido, saudavelmente apostado em dignificar os seus padrões de liberdade, sem confundir a abertura de espírito com a ausência de critério, deu nisto: a tirania silenciosa de outrora a vingar-se na demagogia ruidosa de agora.

Miguel Torga

Como diria o João Ricardo...

O João perguntaria:
- Que livro tem à sua cabeceira???
Então, eu informo que vou começar a ler "O Deserto dos Tártaros" de Dino Buzzati.
(Com alguma vaidade) direi que a a sua tradutora, Margarida Piriquito, é uma amiga.
E vocês???
O que estão a ler?
Eu e o João gostávamos de saber...
Vá lá, não custa nada:
Clica em "chama o jardineiro", depois em "post a comment" e escreve a sua mensagem. Se quiser, clique em "anónimo"(torna- se mais fácil) e finalmente "publish.
(Se quiser dizer quem é, assine depois do que escrever.)
Fico esperando...(quiçá em vão?...)

2005-09-28

De Miguel Torga...

Feliz canto das aves
Sem possível
Compreensão;
Feliz rumo dos astros
Sem possível
Desvio;
Feliz fúria do vento,
Sem possível
Arrependimento

(Miguel Torga)

2005-09-27

Penas...

sentada no muro
uma leve aragem
pousa na minha mão
uma pena de gaivota

(com ironia penso)
como se de "penas"
não estivesse já servida!

(Apesar da forma, não confundam com "poema", até porque lhe faltará subtileza de conteúdo.
Trata- se apenas do relato de um facto absolutamente real.)

Cavaleiro andante

cavaleiro andante

do teu nome fiz um grito
do teu sorriso bandeira
e lutei por mundos novos
armado com rosmaninho numa haste de roseira

e foi ver maçãs cairem de maduras
uma a uma
num chão verde de relva e tinto de papoilas

(Luis FIlipe Duarte)

2005-09-26

Apontamentos do dia. (3)

A pulseirinha...

O que faria aquela pulseirinha de ouro naquele "pernão" gordo?
- Para tornar apetecível o tornozelo?
- Para dar nobreza à passada?
- Para dar encanto à perna?
Se calhar dá!...
(Também resultará em perna magra, tipo esferográfica?...)
Não custa nada tentar!
Nunca se sabe!!!...

Se amanhã passar por vocês um Clio preto com uma lânguida perna a sair da janela, SOU EU, a arejar os meus "empulseirados" encantos!...

(Mas, cuidado! Atenção nos stopes ,cruzamentos e rotundas!)

Apontamentos do dia. (2)

Lá andavam eles!
ELA, magra e elegante, longas pernas, movendo- se irrequieta e ligeira!
A nadar é uma sereia!
ELE, mais gorduchito (mas sem exageros).
Passeavam- se bem dispostos, pela manhã, à beira-mar.
Para ELE, um beijinho.
Para ELA, uma festinha atrás das orelhas!
(Adivinham quem é o par???... Amanhã desvendo o mistééério).

Apontamentos do dia. (1)

Hoje
pelo sim pelo não
estou a "canjas de galinha"!!!

2005-09-25

Na luz, no mar, no vento...

Biografia

Tive amigos que morriam, que partiam
Outros quebravam o seu rosto contra o tempo.
Odiei o que era fácil
Procurei-me na luz, no mar, no vento.

(Tens sempre as exactas palavras!
Obrigada, Sophia de M. B. Andresen).

Verbo do Dia - Carolina

Foi o dia 25 de Setembro de 19.. - que felizardo! - que viu nascer uma linda menina, encantador botãozinho de rosa para os seus enternecidos pais, que alegrou Santiago de Cacém com o seu choro de poetisa e surpreeendeu todos com o seu esbracejar de Mulher.

Depois abriu o seu coração de filha, de mana, de tia, de amiga, de sardinheira, lutou e venceu!

E por que hoje é mais um desses dias especiais, Parabéns, Amiga Calozinha, extensivos a todos a quem dás flores e com quem partilhas a vida!

Dia Feliz, sucessivamente multiplicado!

2005-09-24

Esta coisa do Amor...

"do amor e de ti" e "por dez réis de mel coado" são títulos de dois livros de um Amigo meu.
Desde os tempos do liceu que se percebia que este meu Amigo era Poeta!
Pedi-lhe autorização para vos dar a conhecer alguns dos seus poemas, por isso...

o teu olhar

peguei no teu olhar
desfiz- lhe a cor a forma e o perfume

ficou esse silêncio com que olhas
essa água que bebo sem ter sede
esse fogo que queima sem ter lume

---------------//----------------

entardecer

de frente a este mar iluminado
pelo lento entardecer lembro-me de ti
e aloja- se a ternura no meu peito

a maresia faz nos meus olhos poças de água
onde brilha esta saudade

num búzio vagabundo guardo o som deste mar
e o bater do coração quando te lembro
para reviver no interior dos meus silêncios

(Luis Filipe Duarte é o nome deste meu Poeta Amigo)

2005-09-23

O espírito do outono

Terei de falar do espírito do outono
agora que setembro
chegou ao fim.(Espírito
é palavra suspeita: não há
hipócrita que não se abrigue
à sua sombra.) Será
a embriaguez? O vento matinal
arrastando folhas
raparigas canções?
O sopro frio das estrelas?
Será a beleza,
o espírito do outono? Há um limite
para o homem, um limite
para suportar o peso do mundo.
Da beleza bárbara
orgulhosa beleza,quem sabe defender-se
sem medo do coração lhe rebentar?

(Eug. de Andrade)

2005-09-22

Já repararam?

O pôr- do- sol, em nenhum dia, é igual a outro dia!

Hoje,
enquanto o mar
se banqueteava com o pudim
o céu ficou todo lambuzado de morango.

Psssst!...

Não vos parece um dia "saborosamente fresquinho"?

2005-09-21

Psssst!...

Passem muito bem!
Até amanhãããã!!!!!!

2005-09-20

"Bucolismos"...(da beira-mar)

Cena 1
(6 horas da tarde)
Nunca vi "pato" tão deliciado!
(Era um homem).
Espanejava - se, nadando para cá e para lá, no meio da baía!
O Mar todo só para ele!
Mesmo de longe eu podia adivinhar- lhe o sorriso que, (mesmo que não fosse encantador), era de certeza de encantamento!

Cena II
De biquinhos "ru- ru... ru-ru" dois "pombinhos" arrulhavam, no abrigo dum poleiro vermelho marca Fiat.

Cena III
As gaivotas em sinfonias guinchosas e voos acrobáticos, perseguiam-se umas às outras, por causa dum peixe-mais-que-morto, que uma levava no bico.

Cena IV
Uma "caracoleta", ora parada , ora andando, "caracoleava" por ali aproveitando estes encantos e os últimos raios de sol!

Epílogo
Anoitecia, quando a Caracoleta Carolina, recolhendo os pauzinhos se meteu na sua concha!

2005-09-19

Barato!...

S. Torpes!
Assista- se ao pôr- do- sol comendo um corneto!
Não me digam que não se pode chamar a ISTO, um fresco e saboroso fim de tarde?!!
TUDO, por um euro!
(E ainda há quem diga que a vida está cara...)

2005-09-18

e porque a lua continua...

Apetece-me dançar
ao som do luar
-esse violino
que os outros não ouvem.

Ouviu-o Mozart...
Ouviu-o Beethoven...

Mas hoje sou eu
que o ouço no céu
e danço na terra
com pés de cetim,
lá fora na rua...

Sou eu, pelo Ar...
Sou eu, o luar...
(...que arranquei de mim
e atirei para a lua.)

«José Gomes Ferreira»

Resposta a Vinícius...

Cantiguinha...

Eu subi a um telhado
Para ver a luz da Lua
Encontrei uma gata preta
Diz-me lá se não é tua.

Diz-me lá se não é tua
Se não é fico eu com ela
Eu subi a um telhado
Porque não tenho JANELA...

(Inventei-a para uns meus alunos de 1º ano de escolaridade.
Precisávamos de uma cantiguinha em que aparecesse a palavra "janela".
A melodia é popular e muito agradável.
Estou disposta a cantá-la para quem a queira ouvir!)

Para todos um bom Domingo à luz... do Sol!

2005-09-17

Lá está ela...

Ei Pessoal!!!
Abram a janela e espreitem o céu!
Lá está ela, redonda e brilhande, derramando-se na baía, enroscando-se nos barquitos, alvoroçando gaivotas em espantos de insónia!
Ó raio de bicho!...

Manhã de gaivotas!

Os dias de Verão perderam o calor e as minhas gaivotas VOLTARAM!
A baía está "coalhada" delas!
E lá vou eu com o meu saquito de pão duro cortado aos quadradinhos.
Elas já sabem que sou aquela que passa para lhes dar a "ração".
Também são elas que, lá para o mês de Dezembro, (é... curioso... mas, só no mês de Dezembro), começam a vir à minha janela, esperando, pousadas nos telhados da frente que eu apareça. (Eu??? Melhor dizendo, o pão!!!)
O Lobo Antunes escreveu um livro cujo título é :"Que farei quando tudo arde?"
O livro, que um dia (quem sabe?) eu venha a escrever, talvez se chame: " QUE FAREI QUANDO AS GAIVOTAS NÃO VOLTAREM?"...

2005-09-16

Regresso...

Regresso de parte alguma
Rico mais do que partira,
Pois trago coisa nenhuma
Sem desespero e sem ira.

Agora vivo contente
No meu exílio sereno;
Tomei tamanho de gente
E não me dói ser pequeno.

Pedra parada na calma
Tranquilidade dos charcos
Deixem dormir minha alma,
Como apodrecem os barcos...

(R.Ferreira)

E já que...

E já que o Amigo Mário me emprestou o Livro, tiremos dele proveito!

Na vida somos iguais
às peças que no xadrez
Valem o menos e o mais,
Segundo o acaso que as fez

Do mesmo cepo nascer
Para as batalhas passadas,
Aos mais, peões de perder,
A raros, ficções coroadas.

Mas, findo o jogo, receio
Que, extintas as convenções,
Durma a rainha no meio
Dos mal nascidos peões.

(Reinaldo Ferreira)

2005-09-15

Receita...

RECEITA PARA FAZER UM HERÓI
(De Reinaldo Ferreira)

Tome-se um homem,
Feito de nada, como nós,
E em tamanho natural.
Embeba-se-lhe a carne,
Lentamente,
Duma certeza aguda, irracional,
Intensa como o ódio ou como a fome.
Depois, perto do fim,
Agite-se um pendão
E toque-se um clarim.

Serve-se morto.

(Leia, mas imagine-se a ouvi-lo na voz do Mário Montes.
Mário Montes, quem é???- perguntará você.
Respondo eu: - Sei lá!!!
É UM que eu conheci há pouco e que tem "ares" d' amigo!)

2005-09-14

Procuro...

Procuro uma frase despojada de palavras onde pudesse dizer TUDO!

2005-09-13

O principezinho...

O JOÃO DEU-ME UMA FLOR!

"Se alguém gostar de uma flor da qual apenas existe um único exemplar em milhões e milhões de estrelas, isso bastará para que se sinta feliz quando as contempla. Diz para consigo: « A minha flor está lá, em qualquer parte...» Mas se a ovelha come a flor, é como se , de súbito, todas as estrelas se apagassem."
(O Principezinho, de Antoine de Saint - Exupéry)

E foi então que eu, (tal como o principezinho), desenhei um açaimo para que a minha ovelha não coma a flor que o João me deu!!!

João
Gostei do teu texto, (na resposta que deste ao blog: o Pedro).
É uma escrita muito descritiva com uma mistura de desencanto bem humorado!
E é assim que temos de levar a vida!
Revelas-te um rapaz, às vezes um pouco triste e solitário (e quem não o é nos tempos de hoje?), mas a energia está lá para te ajudar a ultrapassar as dificuldades.
É certo que cada vez nos metemos mais na concha, (cada um vivendo a sua vidinha e o parceiro que se lixe), mas é preciso não perder a coragem, a esperança e principalmente o SORRISO.
E quantas vezes não se recebe de troca apenas um esgar pouco amável, mas aí a gente , mentalmente manda-os "dar uma volta"!
Aquela dos cães que ladram, nas tuas corridas de sapatilhas, está muito boa! Eles babam-se, tu pedes socorro e ninguém aparece na janela. E quem vai aparecer, sabendo nós,( tu e eu) que muitos humanos, não ladrando, mordem mais que muitos cães???!!!
Querido João, gostei de ti e da tua coragem e perseverança.
Agradeço a tua flor e a tua visita!
E espero muito que apareças mais vezes.
Um beijo.
E vai escrevendo as tuas coisas...vamos gostar de lê-las!

2005-09-11

Vou ali...

Uma vez que a minha colega bloguista, hoje, já "salvou a honra do convento" com os seus escritos, se me permitirem, eu : vou ali, já volto!!!

2005-09-10

Reflexos - LXVII

" (...) a criança está muito mais perto da poesia enquanto é ainda criança. (...) Ela toca o nascer das coisas e das palavras, com a maior naturalidade."

Maria Alberta Menéres

Verbo do Dia - Domínio

Ouvi, algures na televisão, que "devíamos abdicar do domínio", porque não somos deuses.

Parei durante alguns minutos, reflecti sobre a frase e concluí que o domínio tolhe a liberdade, derrruba o respeito, rouba a paz, impede a felicidade e contraria o verdadeiro amor.

Faúlhas de Cupido

CORAÇÃO POLAR

Não sei de que cor são os navios
quando naufragam no meio dos teus braços
sei que há um corpo nunca encontrado algures no mar
e que esse corpo vivo é o teu corpo imaterial
a tua promessa nos mastros de todos os veleiros
a ilha perfumada das tuas pernas
o teu ventre de conhas e corais
a gruta onde me esperas
com teus beijos de espuma e de salsugem
os teus naufrágios
e a grande equação do vento e da viagem
onde o acaso floresce com seus espelhos
seus indícios de rosa e descoberta.

Não sei de que cor á essa linha
onde se cruza a lua e a mastreação
mas sei que em cada rua há uma esquina
uma abertura entre a rotina e a maravilha
há uma hora de fogo para o azul
a hora em que te encontro e não te encontro
há um ângulo ao contrário
uma geometria mágica onde tudo pode ser possível
há um mar imaginário aberto em cada página
não me venham dizer que nunca mais
as rotas nascem do desejo
e eu quero o cruzeiro do sul das tuas mãos
quero o teu nome escrito nas marés
nesta cidade onde o sítio mais absurdo
num sentido proibido ou num semáforo
todos os poentes me dizem quem tu és.

Manuel Alegre

Pétalas de Bem-te-Quer - 24.ª

O ruído de uma colher riscando o fundo de um prato de criança subiu pela parede, aproximando o meu olhar de um creme verde no qual uma mão enrugada desenhava círculos sulcados com sopros de apagar velas...
Recolhi pétalas quando me retirei da janela, permitindo que a roupa seca do estendal ensaiasse passos de dança ao ritmo de um ventinho, com receio que alguma poeira mergulhasse no perfumado manjar.

Palavras - XXXVIII

UM FADO: PALAVRAS MINHAS

Palavras que disseste e já não dizes,
palavras como um sol que me queimava,
olhos loucos de um venro que soprava
em olhos que eram meus, e mais felizes.

Palavras que disseste e que diziam
segredos que eram lentas madrugadas,
promessas imperfeitas, murmuradas
enquanto os nossos beijos permitiam.

Palavras que dizias, sem sentido,
sem as quereres, mas só porque eram elas
que traziam a calma das estrelas
à noite que assomava ao meu ouvido...

Palavras que não dizes, nem são tuas,
que morreram, que em ti já não existem
- que são minhas, só minhas, pois persistem
na memória que arrasto pelas ruas.

Pedro Tamen

2005-09-08

Pestanejar...

Convém pestanejar para sacudir a poeira que virá de Troia às quatro da tarde!

2005-09-06

Luto!

Minha amiga Carmindinha.
Mataram o teu filho!
Como é que tu irás sobreviver?

2005-09-04

Não estava...

O Homem triste hoje não estava no jardim!
Veste-se de cores claras, terá sessenta e tal ou setenta anos e leva sempre um saco na mão.
Senta-se e com a cara mais triste deste mundo, olha para o chão mas, (penso eu), fica a olhar para dentro da sua tristeza e nada vê em redor.
Quando se levanta o passo é lento e pouco seguro.
Sente-se que caminha para um qualquer lugar, que para ele não é lugar nenhum!
Um dia vou segui-lo, discretamente.
Intriga-me!
Ao vê-lo, caminhando no seu vazio, eu suspiro (de pena de nada poder fazer) e as árvores abanam a folhagem, como quem sacode uma preocupação.
E o passaredo, será que deu fé???...

2005-09-02

Reflexos - LXV

Evitarei ter demais
e gastarei sempre menos
qualquer navio nenhum cais.

Agostinho da Silva

2005-09-01

Verbo do Dia - Setembro

Setembro era o sétimo mês do ano no calendário primitivo romano, que começava em Março, e consagrado ao deus do fogo, Vulcano.

É um mês de grande importância para a agricultura: limpam-se as ervas daninhas; cortam-se os mamões das árvores; vindima-se; cava-se; aduba-se; enxerta-se; semeia-se.

Quem quiser os seus jardins floridas na próxima Primavera, pode começar a preparar os canteiros e plantar:
- amores-perfeitos;
- begónias;
- cravos e cravinas;
- goivos;
- malmequeres;
- margaridas;
- miosótis, etc.

Em breve chegará o Outono e o mês em que nasce já nos presenteia, pela manhã e à noite, com um saudável fresquinho.

Este mês também tem uma referência na História Portuguesa: A Revolução de Setembro em 1836, a fim de restabelecer a Constituição de 1822.

Ah! E em Setembro também nasceram algumas pessoas especiais cujos parabéns "cantarei" neste espaço.

Bom mês de Setembro para todos!

O pé de vento!

Num dia de temporal, ia eu a atravessar o pátio de escola de sombrinha aberta, quando um "pé de vento" me pegou!
Que isto aqui quando sopra a Nortada...
Fiz prodígios de equilibrio, procurei forças que não tinha e senti os pés erguerem-se do chão, mãos firmes no cabo da sombrinha que me arrastava qual pára-quedas.
Mas... e há sempre um mas...
O meu amigo João Limpinho estava chegando de carro para me visitar!
Ao ver-me levantar voo, nem bem estacionou e mais rápido que uma rajada de vento correu e apanhou-me no ar!!!
Obrigada João!
Pelo teu empenho nesta "operação de salvamento", voltei a ter OS PÉS BEM ASSENTES NA TERRA!!!
Mas não possso deixar de me questionar com certa curiosidade: Se tu não me tivesses reposto no lugar, o que andaria eu "pintando", a estas horas , por esses céus ???
Se calhar já não era Carolina e sim KATRINA o furacão das Américas!

Saltinhos

Era uma jovem senhora que atravessava o jardim com passo determinado, mas,de repente, deu gangão, ao qual se seguiu um movimento brusco e instintivo da cabeça, acompanhado de um olhar "aflito" à volta...

A senhora respirou fundo ao aperceber-se de que não havia mais ninguém naquele espaço, pois eu continuava o meu caminho, aparentemente indiferente à sua presença, embora tivesse receado alguma queda, espreitando, sob os óculos de sol, o seu pé descalço e o saltinho do seu sapato que ficara prisioneiro na calçada...

Recordei-me de incidentes desta natureza que me divertiam na minha meninice e da minha colega, a quem sucedeu algo semelhante, há poucos dias, numa marginal próxima da capital.

Quando fala no assunto, ainda dá gargalhadas, orgulhosa da sua postura, porque ao cair, manteve o pé no sapato e ergueu-se rapidamente, voltando à posição incial num ápice...