2005-03-31

O encarregado

O capacete laranja contrasta com o seu rosto de barba encaracolada, adornado por óculos que lhe permitem a leitura ou a escrita do bloco que traz , orgulhosamente, sempre na mão...Roupa de trabalho, mas limpa, sapatos gastos e esbranquiçados, ossos do ofício, um telemóvel preso à cintura...
Olha o mundo com curiosidade discreta e saúda-o dando os bons-dias a quem passa, tímidamente, sem sorrisos, educamente, acrescentando-lhe um "dona"...
E eu retribuo-lhe o cumprimento, mas escondo o sorriso...não sei se seguindo a prudência que a minha mãe me ensinou quando era pequena, porque não se conhece, se inibida pela dor que renasce no meu peito pela discriminação que muitos insistem em empunhar e que envergonha a raça humana...e as dolorosas palavras e estórias dos africanos ecoam na minha mente...

GRITO NEGRO

Eu sou carvão!
E tu arrancas-me brutalmente do chão.
E fazes-me tua mina
Patrão!

Eu sou carvão!
E tu acendes-me, patrão
Para te servir eternamente como força motriz
mas eternamente não
Patrão!

Eu sou carvão!
E tenho que arder, sim
E queimar tudo com aforça da minha combustão.

Eu sou carvão!
Tenho que arder na exploração
Arder até às cinzas da maldição
Arder vivo como alcatrão, eu Irmão
Até não ser mais tua mina
Patrão!

Eu sou carvão!
Tenho que arder
E queimar tudo como o fogo da minha combustão.

Sim!
Eu serei o teu carvão
Patrão!
José Craveirinha

Recordo, orgulhosamente, o comportamneteo digníssimo do meu paizinho, pioneiro em "pôr a bordo" cabo-verdianos, ensinar-lhes a arte de pescar , alojá-los e sentá-los à nossa mesa nos dias de Natal - coisas de gente grande, despida de preconceitos!

1 comentário:

kanuthya disse...

Ainda há poucos dias contei ao sr. Dé esse feito do amado mestre Jesus. Eu quero sempre bem a quem vê as gentes da minha terra com olhos de ver :)