2005-04-21

Reflexos - XXIV

O Direito de Ler em Voz Alta

Eu pergunto-lhe:
- Quando eras pequena liam-te histórias em voz alta?
Ela responde:
- Nunca. O meu pai andava sempre a viajar e a minha mãe estava sempre muito ocupada.
Eu pergunto:
- Então de onde vem esse teu gosto pela leitura em voz alta?
Ela responde:
- Da escola.
Feliz por ouvir alguém reconhecer algum mérito à escola, exclamo, satisfeito:
- Ah! Estás a ver?
Ela diz-me:
- De modo nenhum. Na escola proibiam-nos que lêssemos em voz alta. O credo da época era a leitura silenciosa. Directamente da vista ao cérebro. (...) Mas, mal chegava a casa, relia tudo em voz alta
- Para quê?
- Para me maravilhar. As palavras pronunciadas começavam a ter existência fora de mim, tinham autêntica vida. Além disso, para mim era um acto de amor.
Era o próprio amor. (...) Deitava as minhas bonecas na minha cama, no meu lugar e lia para elas. Cheguei a adormecer no tapete.

Daniel Pennac, Como um Romance

1 comentário:

Anónimo disse...

Um bom livro que merece ser relido!