2005-10-10

Reflexos - LXX

Com a minha língua
crio novos mundos a partir do nada
e vivo no nada sem me aniquilar nele
Não sujeito a vida
deixo-a vir com o seu dom de vida
e transformo-a em pássaros e janelas
que sobrevoam as cabeleiras das mulheres
abraçando as suas ancas redondas numa
fábula verde
Tenho dois rostos
quando digo sim digo não
e o meu não cruel vibra um sim radioso
Ó mulher quando banhas o teu corpo
e o lavas com as tuas mãos
não é outro corpo que tu sentes no teu?
Eu sou a tua interrogação
eu sou a tua respiração
e a cor da tua respiração
Eu saboreio-te poro a poro
tacteio-te e no teu corpo toco uma melodia
nua

Eu sou um ser errante não sei fixar-me em
nada
sou um criador volúvel
propago as minhas ondas e raízes
e amo quase sem necessidade de amar
Porque amo como o vento e com as raízes
do vento
e com as raízes da água

Tudo o que em mim entra
transforma-se numa exalação de pétalas
em flores de água
em espaços e páginas
em navios errantes

António Ramos Rosa

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