2005-06-09

Linhas e Entrelinhas -VII

A Mário Cesariny

(Sanatório da Quinta dos Vales) Covões - Coimbra
(1952)

Cesariny:

- Uma crise de "coeur" (obsceno não é?) não me deixou ser tão rápido quanto tu desejarias nem tão longo, agora, como seria para desejar. Comecemos pois:
(...)

- M.H.V.Silva, pintora portuguesa conhecida em todo o mundo salvo nos pólos e em Portugal, casada com o pintor húngaro Arpad Szenes e professora de pintura quer no Rio de Janeiro onde ele tinha uma escola quer em Paris onde lecciona pelos ateliers dos discípulos - bom pintor (tipo Alberto Caeiro sem metafísica e com metier...) - Vieira da Silva é uma águia imperial, tipo judia reinante sem excessos de lirismo falando pausado mas cantante (fala como se fosse soprano do Scalla de MIlão! Desde que se olha para ela entra-se num mundo tenebroso de corredores silenciosos e de atmosfera dramaticamente densa - é assim de resto a sua poesia (quadros) que não ri, quando muito grita: ela ri às dentadas: a cabeça dela é não bela mas orgulhosamente histérica.

- Notas finais: Mora no número 5 do Boulevard de St. Jacques num atelier espaçoso onde dormem e têm os seus livros (...) Trabalha muito, vê muitas exposições, está sempre ao par do que se passa e faz e não só no plano da pintura embora principalmente neste. Não se filia. Acha graça que os abstraccionistas a chamen abstraccionista e os surrealistas (?) surrealista. Não é uma "intelectual" no sentido em que exponha e defenda uma tese, antes Realiza. São a pintura e a poesia que lhe interessa realizar e põe-se fora de toda ou qualquer polémica que se desenvolve e corra fora do seu espírito. Vida interior profunda, densa, dramática. Absolutamente alheada da vida partidária, das zangas das comadres e respectivo cortejo de intrigazinhas.

- São ao correr da pena e após, logo após a crise de que te falei o que posso dizer-te da M. Helena Vieira da Silva.
(...)

Por hoje um abraço do
Sempre
António Maria Lisboa

1 comentário:

kanuthya disse...

Escolha prodigiosa destas entrelnhas. Abraço :)